quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Refletindo sobre a identidade do SERIDÓ


“Cada vivente tem um sertão. Para uns são as terras além do horizonte e para outros, o quintal perdido da infância”.

(Oswaldo Lamartine)

Refletindo sobre a identidade do SERIDÓ

A origem do nome SERIDÓ que nomeia um rio e a própria região,já foi muito pesquisado e até nome de tese: "Seridó:refúgio do povo de Deus". Segundo o autor,Seridó em hebraico,equivale a palabra 'sarid',que por sua vez,significa:
Refúgio do povo de Deus.(1)


O que justifica essa possibilidade,foi que no século 17, houve uma grande imigração dos cristãos-novos para esta região, vindos do Ceará, através do oeste do Estado,fugindo da Inquisição.
O Padre Antenor Salvino de Araujo,de Caicó,é um dos adeptos dessa corrente.
Mas este é um assunto polêmico,ainda em discussão.

O mestre e historiador,Luis da Câmara Cascudo, defendia a origem indígena do nome:
"De 'CERI-TOH',sem folhagem,pouca folhagem,pouca sombra ou cobertura vegetal,segundo
Coriolano de Medeiros". (2)

***
O Seridó tem a característica de aglutinar seus filhos com uma força de coesão tão forte que lembra os mulçumanos em relação a Meca.
Em princípio,todo seridoense tem que visitar a região pelo menos uma vez por ano,principalmente, nas festas religiosas da sua cidade,ou na "pegada do inverno",que se dá normalmente nos primeiros meses do ano.
"Caindo chuva"com relâmpagos e trovões(o pai da coalhada),rios cheios,açudes sangrando,tudo isso toca no íntimo do seridoense que cede àquela força de atração que o traz de volta para o seu 'chão'.

EUCLIDES DA CUNHA

Na sua obra-prima "Os Sertões",demonstra que também se deixou contagiar por esta região, quando relata:

"O sertão é um paraíso..."(...) "Assim se vão os dias.
As secas são cíclicas e assolam a região.Dizem os caboclos que se as chuvas não vierem
de 12 de dezembro a 19 de março,haverá seca o ano todo.
Na caatinga estão os cajuís,macambiras,caroás,favelas,juazeiros,
xiquexiques...
Sendo algumas dessas plantas reservatótios de água".
(...)
Quando vem a tormenta,o sertão se transforma em paraíso:
ressurge a flora,com seu verde,suas flores exuberantes à beira das cacimbas.
Ressurge a fauna:catitus,queixadas,emas, seriemas,sericóias,suçuaranas
..."(3)
***

JOSÉ AUGUSTO BEZERRA DE MEDEIROS

Na visão de um político,filho de Caicó,
que governou o Estado de 1924 a 1927:

"O Seridó é um vasto trecho do território do Rio Grande do Norte,atravessado e cortado pelo rio do mesmo nome e afluentes(...).Na vida social,política e econômica daquele Estado nordestino,a região seridoense,tem ocupado sempre papel de relevo e saliência,fornecendo muitas vezes alguns filhos ilustres para a sua direção e contribuindo continuamente com a sua produção para o fortalecimento da riqueza coletiva"(4)
***
O etnólogo Oswaldo Lamartine, sertanista, um dia definido por Rachel de Queiroz como o maior conhecedor do sertão:

"Acho que, no Brasil, ninguém entende mais do sertão e do Nordeste do que Oswaldo" .

Nos revela, através da palavra,todo sentimento que carrega sobre a realidade
dessa região:
“É que o Sertão (Seridó) é mais do que uma região fisiográfica.Além da terra, das plantas, dos bichos e do bicho-homem – tem o seu viver, os seus cheiros, cores e ruídos.
O cheiro da água que nos desertos também cheira.
O da terra molhada, do curral, da lenha queimada e de cada flor.
O belo-horrivel-cinzento dos chãos esturricados, o “arrepio-verde” da babugem, a explosão em ouro das craibeiras em flor.
Os ruídos dos ventos, das goteiras, do armador das redes.
O balido das ovelhas, o canto do galo, o estalo do chicote dos matutos, o ganido dos cachorros em noite de lua, os tetéus, o dueto das casacas de couro, os gritos do socó a martelar silêncios, os aboios, o bater dos chocalhos, o mugido do gado e tantos outros que ferem nas ouças da saudade”.(5)

***

MOACYR CIRNE, seridoense e poeta.

-O SERIDÓ SOMOS NÓS-

Nossas águas, nossas oiticicas, nossos sonhos – o Seridó somos nós.Nossos sertões, nossas canjicas, nossas alegrias – nós somos o Seridó.
Nossos aboios, nossas gentes, nossas quimeras – o Seridó somos nós.
Nós somos o Sertão, mesmo quando somos Pirapora Natal e Olinda.Mesmo quando somos o Fluminense, o Flamengo, o ABC e o América.
Porque somos a chuva, o relâmpago, o trovão, o rio de barreira a barreira.
Porque somos nossas cruvianas, nossas virações, nossos horizontes.
Porque somos: Caicó Cruzeta Acari Ouro Branco e Jardim do Seridó.Carnaúba Parelhas São José Currais Novos e Timbaúba.
Porque somos.
O Seridó em todos nós: Serra Negra do Norte Jucurutu serrote solidão.
O ambó o barreiro o açudeco o açude o Itans o boi a boiada e o boiadeiro.
A caatinga o caatingueiro o chapéu-de-sol o chapéu-de-couro. E o sertão.
O Seridó somos nós. Nós somos o Seridó, capelas santanas e vaqueiros
.(6)

(Para Oswaldo Lamartine de Faria-31/03/2007)
***

O poeta Jorge Fernandes, precursor da poesia moderna no Brasil, também se rendeu aos encantos da região durante uma visita à aquelas paragens. Em prosa, ele descreve o percurso que fez, com tantos detalhes os elementos que compõe essa região, que nos faz “viajar”
junto com ele:

– À tardinha em viagem no Seridó –

"O meu carro vai rodando nas estradas de areia barrenta ou de cascalhos e eu vou vendo o verde
longe e o verde perto das juremas junto à estrada...
As caatingas vão se tornando escuras esfregando os olhos com o sono...
Na carreira do carro aparece de supetão um serrote, às vezes com uma
pedra fina e sisuda apontando o céu.
Outros com pedras também
parecendo dedos muito grandes apontando:
- Olhem aquilo ali - E eu olho
e vejo só desertos de serras e um restinho de luz do sol se acabando nas corcundas das serras, verdes...verdes...
Outras pedras agrupadas e enfeitadas de facheiros vão passando na ligeireza da viagem...
E o carro corre entre árvores e serrotes até que a boca da noite – chega agasalhando tudo, acendendo os olhos dos bacuraus, das raposas, das tacacas, antes que meu carro abra também os seus olhos atrapalhadores dos bichos que precisam ganhar o pão, à noite, farejando nas estradas..."(7)

***
Paulo Bezerra
Paulo Balá(como é conhecido), seridoense, médico, fazendeiro, escritor e membro da Academia Norte Rio Grandense de Letras, no livro que "acabou de sair do forno"...

-Novas cartas dos sertões do Seridó-
"Seridó, zona de transição entre a caatinga e o sertão, todos sabem, nasceu no rastro das boiadas e cresceu no cheiro do estrume dos currais tendo como primeiro pilar da sua economia a criação de gado.
Mais tarde foi encontrado o algodão mocó – a segunda pilastra econômica que, com a expansão e o beneficiamento, fixou o homem à terra de onde tirava o de comer e o de vestir e que teve no meu tio-avô Chico Raimundo a primeira pessoa a se preocupar com ele, selecionando-o.
Depois foi sendo descaracterizado até quando chegou o bicudo “achanando” a atividade. Zé Augusto, por sua vez, foi o grande apaixonado dele, inclusive, para substituir o Campo de Semente de Bulhões a ser coberto pelas águas do Gargalheira, a Estação Experimental do Seridó, em Cruzeta, antiga vila dos Remédios.
O terceiro mourão econômico veio com as riquezas minerais, o homem cavando buraco feito peba.
Currais Novos pelo avantajado das minas de scheelita, uma com sessenta quilômetros de túneis, e Carnaúba dos Dantas, pela diversidade dos minérios, viram correr riquezas na mão de gente que se pôs lorde.
Mas um dia a roda desandou restando agora o que veio primeiro, i.é. a pecuária mesmo assim açoitada por anos de desmantelados conquanto se constitua ainda na grande bacia leiteira do estado, o “beradeiro” a escorropichar o peito das vacas". (8)


Fontes:Google
3.Livro: Os Sertões -(1902) - Euclides da Cunha
4.José Augusto - Livro SERIDÓ – Borsoi – Editor – Rio de Janeiro – 1954
5.Oswaldo Lamartine e Natercia Campos -Livro: Alpendres d'Acauã-2001
7.Jorge Fernandes -Publicado na Revista de Antropofagia – São Paulo n. 07 – novembro de 1928.)
8. Paulo Bezerra -Livro:Novas cartas dos sertões do Seridó - 2009
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4 comentários:

  1. Simplesmente espetacular!!! Ler esses "monstros sagradas" declarando o seu amor pelo Seridó é emocionante e muito nos inspira, dando convicção, também, ao nosso amor pela região.

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  2. amei seu blog, pena que não está mais atualizando parece?
    é muito bom e vale a pena continuar, nós precisamos dele.

    Abraços

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  3. Seu Pery, trabalhei com o Senhor na AEROTUR, não sei se o Senhor vai lembrar de mim, também sou seridoense e nasci às margens do Gargalheiras, sob a proteção da Vigem D'Aguia. Concordo com Moacy Cirne quando diz o sertão somos nós, eu ainda acrescento: o sertão não é só paisagem, o sertão é um modo de viver.
    Grande abraço

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  4. Ola amigo, tudo bem, sou do ceará e tenho uma curiosidade, meu pai tem o nome serido no nome dele, será que tem alguma coisa haver com a região do serido, um grande abraço.

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