quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

POUSO FORÇADO

* CAP-4 - PAULISTINHA (Foto de Floriano Morgado)
Decolei com um Paulistinha da cidade de Assú para Natal, levando um político daquela cidade.
Por solicitação dele, tomei o rumo de Macau e daí na direção leste seguindo o litoral.
Quando voávamos sobre a Chapada do Mato Grande, percebi que o instrumento marcador da pressão do óleo deu um sinal de anormalidade no motor.
Consultei os demais instrumentos e tudo parecia normal,RPM sem oscilações e a temperatura
dentro do permitido.
Por precaução, fiquei de olho naquele mal comportado ponteiro.Esses instrumentos costumam pregar peças (de muito mau gosto) nos aviadores.
Mais cinco minutos de vôo, repetiu-se a mesma anormalidade,só que dessa vez o ponteiro caiu abaixo do mínimo permitido.
Mesmo assim, a temperatura e o RPM continuavam normais.
Achei
que devia tomar algumas providências, por isso, mudei o rumo para à direita na direção de Jardim de Angicos, onde havia um campo de pouso operável com pequenos aviões.



Ao sobrevoar o campo, a situação permanecia inalterada e o motor comportava-se bem.
“Talvez seja pane de instrumento” pensei eu.


Resolvi seguir direto para Natal.
No través de Baixa Verde, a temperatura do motor subiu consideravelmente, e as rotações da hélice caíram. Imediatamente fiz 180º, pensando em alcançar Jardim de Angicos,que estava a dez minutos de vôo; logo concluí que o motor não ia aguentar.
Estavámos voando a 900 metros de altura e tinha bastante tempo para tomar decisões.
Lá embaixo, via-se a cidade de Baixa Verde, atravessada pela linha férrea, o pico do Torreão de sentinela, o açude público com água só no porão, e uma área desimpedida na beira dágua,que poderia servir para pousar.

Enquanto isso,ia perdendo altura lentamente e voava em círculo, observando a área escolhida.
Tinha que ser ali: o vento de frente, poucos obstáculos, “pista”curta, chão de piçarro e dentro da cidade.

Em caso de acidente, havia facilidade de socorro.
(PUBLICIDADE DO PAULISTINHA-Revista O CRUZEIRO, de 17 de maio de 1947)

Fui memorizando os obstáculos e as irregularidades do terreno, enquanto o motor só com 1000 RPM já não reagia.
Nesse momento avisei ao passageiro o que estava acontecendo e fui logo dando instruções para o pouso de emergência.
Cheque de cabine, cintos apertados, tirar óculos,verificar extintores e etc.
Então parti para o pouso.
Como ainda tinha boa altura, fiz o afastamento longo propositadamente,para pegar o início“pista”, pois não ia haver uma segunda chance.

Entrei alto por conta de obstáculos e comandei uma “glissada”violenta(manobra utilizada para perder altura),que nos levou direto ao chão.

Corrigi o avião segundos antes de tocar ao solo e logo senti o atrito dos pneus no cascalho.Instintivamente, cortei os magnetos, colei o manche na barriga a fim de segurar a cauda no chão, mantive a reta e esperei o que ia acontecer.

O terreno irregular provocou muitos solavancos e por sorte, percebi em tempo, de desviar umas pedras no meio da “pista”.
O avião parou bem perto da cerca final coberto por uma nuvem de poeira.
O silêncio era contrastante.
Abri a porta rapidamente e ambos nos precipitamos para fora da aeronave.

Em pouco tempo chegaram os curiosos.

No mesmo dia, à noite, já estávamos em Natal, viajando em um automóvel da firma João Câmara Indústria e Comércio, que nos deu todo apoio.
Retornei à Baixa Verde dois dias depois, acompanhado do mecânico que examinou detidamente o motor. Fez os reparos que julgou necessário e deu o avião como pronto para o vôo.
Eu não estava muito confiante,mas acreditei no mecânico, afinal de contas ele retornaria comigo no avião.
O maior problema naquele momento, era decolar dali,um espaço reduzido de chão irregular e obstáculos de fios de telégrafo no final.

Empurramos o Paulistinha para o início da “pista”, o vento estava forte e de frente, dei partida do motor, chequei os magnetos,acelerei a pleno, freios soltos e lá fomos nós decolando naquela área improvisada.

Na corrida cheia de solavancos, a “pista” ia sendo engolida e já na metade passamos em cima de um “munduru” (formigueiro extinto) que impulsionou o avião para o alto.
Aproveitei a oportunidade para segurá-lo no ar em vôo horizontal, tentando ganhar velocidade.

Levantei o nariz do avião, tanto quanto me atrevi, para ultrapassar a rede de fios telegráficos,cedi o manche em seguida, e continuei voando rasante por cima de um roçado de algodão até ganhar a velocidade necessária para uma subida normal.

Chegamos em Natal cinquenta minutos depois, com o avião apresentando o mesmo problema anterior, só que dessa vez a dor de cabeça seria para o mecânico o Sr. Raimundo Lustosa que me acompanhava naquele vôo.
................

*CAP-4 - PAULISTINHA - O Paulistinha era robusto, de pilotagem simples e manutenção fácil. Por ser de construção simples, a CAP chegou a fabricar um Paulistinha por dia em 1943, no auge de sua fabricação, que encerrou em 1948. Com exceção dos motores, que vinham dos EUA, praticamente todos os demais itens eram de fabricação nacional.

O Paulistinha foi produzido em três versões, sendo que o modelo CAP-4A era a versão de instrução com 777 unidades produzidas.

Além das suas boas qualidades aeronáuticas, o sucesso comercial do Paulistinha deveu-se também à Campanha Nacional de Aviação, um movimento criado em 1941 para levantar fundos para a compra de aeronaves de instrução de fabricação nacional, visando sua distribuição aos diversos aeroclubes do Brasil.

Origem: Brasil (Companhia Aeronáutica Paulista)Dimensões: comprimento: 6,71 m; envergadura: 10,67 m; altura: 2,10 m; Superfície alar: 17,00 m2.
Pesos: vazio: 320 kg; máximo na decolagem: 535 kg.
Motores: um motor ContinentalA-65-8 de 4 cilindros em linha, desenvolvendo 65 HP, refrigerado a ar.
Desempenho: velocidade máxima: 160 km/h; razão inicial de subida: 240 m/min; teto de serviço: 3.800 m; Autonomia 4 h.
Tripulação: dois tripulantes em tandem


FONTE E FOTOS : Obtidos no Google

Nenhum comentário:

Postar um comentário