domingo, 31 de janeiro de 2010

AEROSTAÇÃO/AVIAÇÃO

Alberto Santos Dumond

Augusto Severo de Albuquerque Maranhão


Ainda hoje faz-se certa confusão entre Aerostação e Aviação.

São primas-irmã, mas bem diferentes.
Aerostação é o estudo do mais leve que o ar, os balões, seu desenvolvimento e sua utilização prática.

A aviação é o estudo do mais pesado do que o ar,respeitando-se as leis de física, para se chegar ao avião como instrumento de utilização pelo homem.
É nesse ponto que está à confusão que se faz ao ligar o nome do nosso aeróstata Augusto Severo, à aviação.

Na verdade todo o seu trabalho estava ligado diretamente a aerostação.
Mais de um século antes de Severo chegar à França, já pesquisavam o assunto:
Em 1783 Joseph e Etienne Montgolfier, em Annonay/França construíram um grande invólucro de papel seda com uma abertura na base para ser inflado com fumaça de palha queimada.
Pilâtre de Rosier e o seu companheiro Marquês d'Arlandes, no dia 21 de novembro daquele mesmo ano, subiram num balcão livre em Bois de Boulogne,alcançaram 300 metros de altura e desceram sem problemas a cerca de um quilômetro de onde haviam partido.
O francês Henri Giffard voara precariamente a uma velocidade de um quilômetro por hora, num balão em forma de charuto.


Alberto Santos Dumont contorna a
Torre Eiffel com o Dirigível
Nº 6 e vence o prêmio Deutsch (19/10/1901)


Em 08 de novembro de 1881, o brasileiro *Julio César Ribeiro de Souza, nascido no estado do Pará, realiza em Paris o primeiro vôo público e cativo do aeromodelo, que sobe avançando para frente, feito repetido no dia 12 do mesmo mês.

Julio César Ribeiro de Souza

Em 1883 os irmãos Gaston e Albert Tissander, usando um motor elétrico, atingiram cinco quilômetros por hora. Em 1884, no exército francês o coronel Charles Renard e o tenente Arthur Krebs, usando um balão impulsionado com um motor elétrico, alcançaram 23 km por hora.
O assunto empolgava as pessoas, e até entre os padres surgiu um pesquisador, como foi o caso de padre brasileiro, Lourenço de Gusmão,que em 1709 escandalizou a igreja com o seu invento que denominou de“Passarola”.

Seguindo o rastro desses pioneiros, aqui no Brasil,estava Alberto Santos Dumont e logo depois Augusto Severo de Albuquerque Maranhão.

Santos Dumont, em 1891, depois de ler tudo que se relacionava com os balões e a literatura do escritor Julio Verne, decidiu partir para Paris, já emancipado, a fim de realizar o seu sonho.
Teve o apoio do pai, um rico plantador de café no Brasil, que lhe deu os meios para viver na França e pôr em prática às suas idéias.
O pai disse-lhe uma frase:
“Prefiro que não se faça doutor.”
Aí começou a sua vida em busca do domínio dos balões; continuou suas pesquisas até chegar ao avião.
Severo, motivado pelo que já se fazia na Europa, passou a se interessar pelo assunto
e foi aumentando os seus conhecimentos com algumas experiências sem resultados práticos aqui no Brasil.
Chegou a conclusão que teria de ir para Paris onde achava que venceria com as suas teorias e conhecimentos aqui acumulados.
Reuniu os meios e lá chegando iniciou a construção do seu balão; o escritor Paul Offmann no seu livro “Asas da Loucura”, p. 69, escreveu:

“Inspirado nos trabalhos de Santos Dumont,
Severo construíra um aeróstato batizado de PAX.
Acompanhado de Saché, o maquinista(mecânico), iniciou a subida. Mas as fagulhas do motor a petróleo inflamaram o balão e o hidrogênio explodiu.”

Santos Dumont, tentando explicar as causas do acidente de Severo,
assim registrou no seu livro, “Os Meus Balões”.p. 148:

“Uma das hipóteses pelas quais pode se explicar o terrível acidente sobrevindo ao PAX, dirigível do infortunado Augusto Severo,se relaciona com este grave problema de válvulas (válvulas desegurança).
O PAX, inicialmente tinha duas válvulas.
Antes, porém de partir para a sua primeira e última viagem, o Sr. Severo, que não tinha prática aeronáutica, fechou uma com cera.
Ora, dado que a pressão atmosférica decresce com a altitude, a subida dum dirigível deveria ser lenta e limitada:- para dilatar o gás basta uma subida de alguns metros. (...)Parece que no mesmo instante em que o PAX deixou a terra(...) parecia um foguete, e a dilatação, a explosão e a horrorosa queda não foram senão um encadeamento de conseqüências”.

Especificamente, no caso de Severo, foi uma frustração para o Brasil, o acidente que o vitimou no dia 12 de maio de 1902.
Nunca se soube e nem vai se saber os seus planos e as soluções que ele teria dado aos balões para se tornarem máquinas modernamente utilizáveis.
Os registros históricos estão aí para serem consultados.
Por conta desse infeliz acontecimento, e pela ausência de anotações técnicas de Severo, por mais esforço que se faça em favor do aeróstata, que
passou para história, como um mártir da aerostação.


*Julio César Ribeiro de Souza –(Acará, 13 de junho de 1843-Belém, 14 de outubro de 1887).
Inventor brasileiro, reconhecido como o precursor da dirigibilidade aérea. Em 1874, depois de observar o vôo de pássaros amazônicos, passa a dedicar-se ao estudo das ciências aeronáuticas.
Após seis anos de pesquisas, Ribeiro de Sousa acredita que os balões devem ter formato assimétrico, com o centro de empuxo à frente, formato já preconizado e utilizado por vários inventores franceses, como Guyot, Eulriot e Pierre Jullien. Após ter realizado conferência no Pará sobre suas idéias, parte para o Rio de Janeiro, onde vai ao encontro do Barão de Teffé, conhecido e respeitado na comunidade científica brasileira.
O Barão de Tefé analisa os estudos de Júlio César Ribeiro de Sousa, fica entusiasmado e pesquisa por um mês material europeu sobre aeronáutica. Escapou-lhe, porém, o fato de que muitas das idéias de Júlio César Ribeiro de Sousa já haviam sido utilizadas por inventores franceses.
Desta forma Ribeiro de Sousa consegue apoio do Instituto Politécnico do Rio de Janeiro então a maior instituição científica da América Latina. Com o apoio do Instituto e do governo imperial, consegue uma verba (20 contos de réis) da província do Pará.

Com estes recursos parte para à França e na Casa Lachambre em Paris encomenda a construção de seu balão batizado Le Victoria nome de sua esposa.
Antes do início de sua construção comparece à Sociedade Francesa de Navegação Aérea expõe suas idéias e providencia a patente de seu invento: o "balão planador".

Patenteou seu invento nos seguintes países: França,Estados Unidos,Alemanha,Inglaterra, Alemanha,Rússia,Portugal,Áustria e Brasil.
No Brasil, são feitas demonstrações no dia 25 de dezembro de 1881, no Pará, e em 29 de março de 1882, no Rio de Janeiro, sendo que nesta última o balão sofre um rombo, ficando seriamente avariado.

Consegue no Pará a liberação de mais 36 contos de réis. Retorna a Paris e encomenda a construção de seu grande balão, com 52 metros de comprimento e 10,4 metros de maior diâmetro.
Em 12 de julho de 1884, na Praça da Sé em Belém, Ribeiro de Sousa tenta realizar a ascensão de seu grande balão, então denominado Santa Maria de Belém.


A fim de produzir o hidrogênio necessário para inflar o balão, ele conta com a ajuda de pessoas esforçadas, mas inexperientes. Os materiais e equipamentos são manipulados de forma incorreta o que acaba por danificar e impossibilitar a experiência.
Em 1886 conseguiu da Assembléia do Governo do Pará a quantia de 25 contos de réis.

Munido destes recursos retorna à França e constrói seu último balão: o Cruzeiro, com o qual realizou demonstrações públicas.
Ao chegar a Paris propôs debates públicos com Renard e Krebs na Sorbonne e na Academia de Ciências da França, mas é ignorado pelos capitães franceses.
Em seu editorial de 13 de maio de 1886, o jornal parisiense "L'Opinion" publica um histórico das realizações de Ribeiro de Sousa, desde a aprovação de suas teorias no IPB no início de 1881 até aquela data, mencionando que o protesto do brasileiro tinha merecido comentários favoráveis dos países que o receberam, e fazendo votos de que se fizesse justiça a quem de direito.
Este artigo foi enviado pelo próprio Ribeiro de Sousa a membros do governo e às academias francesas, a Renard e Krebs, e a toda a imprensa parisiense, sem ter recebido nem apoio nem contestação durante esta que foi a sua última estada na França.
Júlio César Ribeiro de Sousa não influenciou praticamente nenhum dos pioneiros da aeronáutica que se seguiram a ele, à execeção de Augusto Severo de Albuquerque Maranhão, que passou a se interessar pelo mais leve que o ar depois de tomar conhecimento das promissoras experiências do paraense com aeromodelos.
O primeiro dirigível do mundo é a aeronave N-6, do mineiro Alberto Santos Dumond campeã do ‘Prêmio Deutsch’, em 1901, que nada aproveitava das idéias de Ribeiro de Sousa. Júlio César Ribeiro de Sousa morreu em Belém a 14 de outubro de 1887. A causa de sua morte foi o beribéri. Faleceu em completa pobreza.



Fonte: Google

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

POUSO FORÇADO

* CAP-4 - PAULISTINHA (Foto de Floriano Morgado)
Decolei com um Paulistinha da cidade de Assú para Natal, levando um político daquela cidade.
Por solicitação dele, tomei o rumo de Macau e daí na direção leste seguindo o litoral.
Quando voávamos sobre a Chapada do Mato Grande, percebi que o instrumento marcador da pressão do óleo deu um sinal de anormalidade no motor.
Consultei os demais instrumentos e tudo parecia normal,RPM sem oscilações e a temperatura
dentro do permitido.
Por precaução, fiquei de olho naquele mal comportado ponteiro.Esses instrumentos costumam pregar peças (de muito mau gosto) nos aviadores.
Mais cinco minutos de vôo, repetiu-se a mesma anormalidade,só que dessa vez o ponteiro caiu abaixo do mínimo permitido.
Mesmo assim, a temperatura e o RPM continuavam normais.
Achei
que devia tomar algumas providências, por isso, mudei o rumo para à direita na direção de Jardim de Angicos, onde havia um campo de pouso operável com pequenos aviões.



Ao sobrevoar o campo, a situação permanecia inalterada e o motor comportava-se bem.
“Talvez seja pane de instrumento” pensei eu.


Resolvi seguir direto para Natal.
No través de Baixa Verde, a temperatura do motor subiu consideravelmente, e as rotações da hélice caíram. Imediatamente fiz 180º, pensando em alcançar Jardim de Angicos,que estava a dez minutos de vôo; logo concluí que o motor não ia aguentar.
Estavámos voando a 900 metros de altura e tinha bastante tempo para tomar decisões.
Lá embaixo, via-se a cidade de Baixa Verde, atravessada pela linha férrea, o pico do Torreão de sentinela, o açude público com água só no porão, e uma área desimpedida na beira dágua,que poderia servir para pousar.

Enquanto isso,ia perdendo altura lentamente e voava em círculo, observando a área escolhida.
Tinha que ser ali: o vento de frente, poucos obstáculos, “pista”curta, chão de piçarro e dentro da cidade.

Em caso de acidente, havia facilidade de socorro.
(PUBLICIDADE DO PAULISTINHA-Revista O CRUZEIRO, de 17 de maio de 1947)

Fui memorizando os obstáculos e as irregularidades do terreno, enquanto o motor só com 1000 RPM já não reagia.
Nesse momento avisei ao passageiro o que estava acontecendo e fui logo dando instruções para o pouso de emergência.
Cheque de cabine, cintos apertados, tirar óculos,verificar extintores e etc.
Então parti para o pouso.
Como ainda tinha boa altura, fiz o afastamento longo propositadamente,para pegar o início“pista”, pois não ia haver uma segunda chance.

Entrei alto por conta de obstáculos e comandei uma “glissada”violenta(manobra utilizada para perder altura),que nos levou direto ao chão.

Corrigi o avião segundos antes de tocar ao solo e logo senti o atrito dos pneus no cascalho.Instintivamente, cortei os magnetos, colei o manche na barriga a fim de segurar a cauda no chão, mantive a reta e esperei o que ia acontecer.

O terreno irregular provocou muitos solavancos e por sorte, percebi em tempo, de desviar umas pedras no meio da “pista”.
O avião parou bem perto da cerca final coberto por uma nuvem de poeira.
O silêncio era contrastante.
Abri a porta rapidamente e ambos nos precipitamos para fora da aeronave.

Em pouco tempo chegaram os curiosos.

No mesmo dia, à noite, já estávamos em Natal, viajando em um automóvel da firma João Câmara Indústria e Comércio, que nos deu todo apoio.
Retornei à Baixa Verde dois dias depois, acompanhado do mecânico que examinou detidamente o motor. Fez os reparos que julgou necessário e deu o avião como pronto para o vôo.
Eu não estava muito confiante,mas acreditei no mecânico, afinal de contas ele retornaria comigo no avião.
O maior problema naquele momento, era decolar dali,um espaço reduzido de chão irregular e obstáculos de fios de telégrafo no final.

Empurramos o Paulistinha para o início da “pista”, o vento estava forte e de frente, dei partida do motor, chequei os magnetos,acelerei a pleno, freios soltos e lá fomos nós decolando naquela área improvisada.

Na corrida cheia de solavancos, a “pista” ia sendo engolida e já na metade passamos em cima de um “munduru” (formigueiro extinto) que impulsionou o avião para o alto.
Aproveitei a oportunidade para segurá-lo no ar em vôo horizontal, tentando ganhar velocidade.

Levantei o nariz do avião, tanto quanto me atrevi, para ultrapassar a rede de fios telegráficos,cedi o manche em seguida, e continuei voando rasante por cima de um roçado de algodão até ganhar a velocidade necessária para uma subida normal.

Chegamos em Natal cinquenta minutos depois, com o avião apresentando o mesmo problema anterior, só que dessa vez a dor de cabeça seria para o mecânico o Sr. Raimundo Lustosa que me acompanhava naquele vôo.
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*CAP-4 - PAULISTINHA - O Paulistinha era robusto, de pilotagem simples e manutenção fácil. Por ser de construção simples, a CAP chegou a fabricar um Paulistinha por dia em 1943, no auge de sua fabricação, que encerrou em 1948. Com exceção dos motores, que vinham dos EUA, praticamente todos os demais itens eram de fabricação nacional.

O Paulistinha foi produzido em três versões, sendo que o modelo CAP-4A era a versão de instrução com 777 unidades produzidas.

Além das suas boas qualidades aeronáuticas, o sucesso comercial do Paulistinha deveu-se também à Campanha Nacional de Aviação, um movimento criado em 1941 para levantar fundos para a compra de aeronaves de instrução de fabricação nacional, visando sua distribuição aos diversos aeroclubes do Brasil.

Origem: Brasil (Companhia Aeronáutica Paulista)Dimensões: comprimento: 6,71 m; envergadura: 10,67 m; altura: 2,10 m; Superfície alar: 17,00 m2.
Pesos: vazio: 320 kg; máximo na decolagem: 535 kg.
Motores: um motor ContinentalA-65-8 de 4 cilindros em linha, desenvolvendo 65 HP, refrigerado a ar.
Desempenho: velocidade máxima: 160 km/h; razão inicial de subida: 240 m/min; teto de serviço: 3.800 m; Autonomia 4 h.
Tripulação: dois tripulantes em tandem


FONTE E FOTOS : Obtidos no Google

sábado, 23 de janeiro de 2010

UM COCHILO NAS ALTURAS

PBY-CATALINA
Nos anos ‘50 a aviação comercial brasileira vivia momentos de grande euforia. Muitas empresas disputando o mercado nacional, e em consequência disso,havia certa escassez de pilotos.
A oferta de emprego para aviadores era franca, e as empresas aéreas contratavam até jovens pilotos, sem grandes experiências,
para concluir o seu treinamento na própria companhia.

Este fato deu-se também aqui em Natal.



Cargueiro PBY-Catalina da AEROGERAL LTDA

Uma pequena empresa local, a ‘AERO GERAL LTDA’ ,que voava para Santos, pelo litoral, usando os aviões cargueiros Catalina (excedentes de guerra), fez uma proposta por viagens, para novos pilotos, e eu estava entre eles.
De bagagem profissional só tínhamos 200 horas de voo em monomotores,
uma licença recém-expedida, uma sacola de viagem de lona, um surrado blusão de couro e um óculos “Ray-Ban”.
Reduzidos ao status de párias na comunidade do clã dos aviadores profissionais,
éramos tratados como tal, e sobrava para nós todo e qualquer trabalho necessário na operação do voo, além de dividir as etapas com o comandante, pilotando o lerdo Catalina.

Certo dia, havíamos decolado do Rio de Janeiro para o Nordeste, com um cargueiro fazendo todas às escalas da rota:

Vitória, Belmonte, Ilhéus, Salvador (pernoite); Aracaju, Maceió, Recife terminando em Natal.

Em cada pouso, o co-piloto tinha que agir para ancorar o Catalina (hidro) e ajudar na entrega da carga daquele destino, para não atrasar a saída.
Repetia-se isso em todas as escalas.

A tripulação já sentia o desgaste físico de três dias seguidos voando sem o necessário repouso.
Voávamos entre Maceió e Recife, quando o Comandante apontou para o volante indicando que eu assumisse a pilotagem (o Catalina não tinha piloto automático). Ele iria tirar um cochilo.

A aeronave deslizava suavemente naquele ar de temperatura amena no rumo de Recife.
O rádio-operador foi até a cabine dos pilotos e falou-me:

“Quando sobrevoar Tamandaré (município de Pernambuco) avise-me, para dar a posição ao Centro de Controle de Recife”.

– OK. Confirmei.

Naquele momento o Comandante já dormia com a cabeça num travesseiro, encostado na janela lateral.

O Catalina nivelado, voo de cruzeiro a seis mil pés de altura, alguns cúmulos esparsos, céu azul nordestino sem turbulência.

A luminosidade intensa castigava os meus olhos, apesar da proteção do “Ray-Ban”.
O cansaço se manifestou e foi invadindo o meu corpo.
O ar rarefeito frio que entrava pelas frestas do pára-brisa, o silêncio dentro da cabine, o ronrom musical dos motores bem sincronizado, foram o suficiente para me ‘embalar’, e pouco tempo depois, eu dormia o ‘sono dos justos’.

Uns dez minutos pelo menos decorreram, quando o rádio-operador voltou à cabine, tocou no meu ombro e veio a pergunta crucial:

“Cadê Tamandaré?!!!...”

Nesse momento despertei espavorido, e me dei conta de que a cidade de Tamandaré já tinha ficado para trás e sobrevoávamos a praia de Piedade nos arredores de Recife.
Reconheço à falha, o susto foi grande,um procedimento de risco causado pelo estado de estafa que estávamos acometidos.
O Comandante sonhava nos "braços de Morfeu",e nunca tomou conhecimento desse fato.


Atualmente, a profissão de aeronauta no Brasil, é regulamentada através da Lei Nº 7.183, de 05 de abril de 1984,e um dos propósitos, é evitar o comprometimento da saúde física e mental das tripulações,elaborada em turnos de repouso a jornada de trabalho.

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VOANDO NO PT-19 COM TIO OSWALDO

Com a transferência da Escola de Pilotagem, do Aeroclube para Capim Macio (uma pista onde hoje funciona um Clube de Aeromodelismo), as visitas ao hangar de pessoas interessadas em conhecer as atividades aéreas ali praticadas, ficaram mais frequentes.

Certo dia, levei o meu tio Oswaldo lá.
Ele havia me pedido para fazer umas fotos aéreas do local aonde trabalhava na Colônia Agrícola do Pium.
Preparei o avião um PT-19 (Fairchild) para o vôo.
Acomodei-o no assento do passageiro,afivelei o cinto de segurança, liguei a chave de contatos,e o mecânico acionou a manivela.
O motor pegou da primeira vez.
Infelizmente, a comunicação entre nós seria prejudicada e se daria só por meio de sinais, pois o interfone acústico havia sido retirado para manutenção. Tínhamos que voar sem este equipamento, o que iria comprometer muito o diálogo entre nós, pois o avião tinha a cabine aberta e os assentos em 'tanden',ou seja,um assento atrás do outro.

Tio Oswaldo preparou sua câmera “Rolleiflex” e nessa altura já estávamos voando.Enquando ainda subíamos, já em cima do mar, senti um movimento no manche, olhei para trás, era ele tentando me indicar o local que queria fotografar.
Nesse momento vi a câmera em minha direção e o movimento dele acionando o disparador da máquina.
A foto é esta que está postada acima.
Voamos cerca de meia hora, a "Rolleiflex" foi acionada várias vezes, e retornamos ao campo, fazendo um pouso suave naquele belo avião, que apesar do tamanho/peso, era facílimo de ser pilotado.


Já no hangar, sentados nas poltronas do pátio, conversando sobre o vôo, tio Oswaldo me falou que naquela primeira foto perdeu o equipamento da câmera chamado “parasol”, arrancado pelo vento.
Para mim foi um prazer imenso fazer aquele vôo junto com ele,por ser uma pessoa com quem eu tinha muita afinidade e também de poder demonstrar à minha família, através dele, o quanto eu estava realizado profissionalmente nesta atividade.



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domingo, 10 de janeiro de 2010

DECOLANDO COM UM PT-19

PT-19 -Fairchaild

A tarde avançava e não havia ali a menor condição de pernoite. Com ajuda do “guarda campo”, do colega que viajava comigo e umas tábuas encontradas no local, desatolamos o avião.
O vento fortíssimo de rajadas, bom para pista mais curta,mas que estava encharcada e tinha árvores altas pouco depois do final.
Não ia ser fácil arrancar dali àquela tonelada de avião.
Demorei na decisão, achava a margem de segurança muito pequena e não havia escolha.
Já eram 16 horas, o céu encoberto ia escurecer rapidamente.
Pela grande experiência que tinha no PT-19 (Fairchaild), aceitei correr o risco de decolar naquelas condições que se apresentavam.
Dei partida no motor acertei o avião no eixo da pista, puxei o freio de estacionamento, ataquei o motor a pleno, contei até cinco e soltei o freio.
O avião deu uma arrancada para frente, caindo numa poça d´agua recuperando-se em seguida.
Corria e era sustado pelas sucessivas poças de lama que ia encontrando na pista.
Ao final do primeiro terço a velocidade ainda não dava para acionar o velocímetro.
O motor rugia a toda potência e a temperatura foi lá para as alturas.
A pista ia se consumindo e a velocidade pouco aumentava. As árvores preocupavam-me.
Sustentava a cauda baixa e caprichava na pilotagem.

Cockpits - PT -19

Na metade da pista o velocímetro só marcava 40 MPH; era um verdadeiro pandemônio de água e lama no parabrisa, causado pela hélice a 2.300 RPM, prejudicando a visibilidade.

Quando pude divisar algo, vi que as árvores à esquerda, eram as mais baixas.
O motor continuava a pleno com a temperatura atingindo alturas perigosas.

Não podia reduzir, pois necessitava da potência máxima naquele momento. Também não havia mais tempo e nem espaço para abortar a decolagem.

De repente o velocímetro marcou 50 MPH,pronto para o desafio, arranquei o avião do solo com determinação. Ele subiu em meio "stall" e afundou,não se matendo no ar.
Por sorte nossa, voltou ao solo com todo o seu peso, num lugar enxuto e foi ricocheteado para o alto.

Com uma ligeira pressão no manche consegui segurá-lo no ar, em vôo horizontal, a pouca altura. Cedi o manche para tentar ganhar velocidade.

A minha preocupação agora eram as árvores que se aproximavam com uma incrível rapidez; fiz uma ligeira pressão no pedal e fui mudando o rumo para as mais baixas.
Pressionei mais um pouco o manche para trás e venci as primeiras árvores que passaram rápidas sob as asas. Já com algum controle no comando de asa, mudei o rumo para esquerda e depois para à direita, desviando as copas mais altas que não consegui ultrapassar.

Várias vezes senti o impacto dos galhos no trem de pouso, que não chegou a prejudicar o vôo a baixa velocidade. Lentamente fomos ganhando mais velocidade e altura, saindo fora do perigo daquela mata nativa, com árvores de até 30 metros de altura.

Iniciei uma subida normal até onde o teto permitiu, rumando diretamente para Salvador.
Não gastamos mais do que dois ou três minutos naqueles momentos de grande perigo e tensão.

Eu e o avião havíamos sidos submetidos a um verdadeiro massacre na nossa capacidade de resistir, atingindo o ponto de quase rotura.

Já na tranquilidade do vôo de cruzeiro, o avião bem ajustado nos seus compensadores, o rumo certo, o tempo deu uma chance, e só então soltei os nervos que doíam e os músculos todos tremiam.
Esparramado na poltrona de comando aguardava a cidade de Salvador aparecer na proa.


Pery Lamartine- "ESCAPE,estórias de aviador"
Fotos obtidas no Google