terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

TIMBAÚBA - IV


Ilustração de Dorian Gray



IV- A CASA GRANDE
            Assentada no alto – para melhor aproveitar a ventilação e oferecer posição mais vantajosa, quando dos ataques dos cangaceiros – era uma construção sóbria, alpendrada, de duas águas e levantada com madeira, pedra, tijolo e telhas, colhidas na própria fazenda.  Nenhum enfeite transparecia da sua arquitetura, e o seu conforto maior parecia residir no frio das lajes do alpendre, ou na carícia da rede armada nos quartos do sótão. De ferragens grosseiras – chaves que, algumas vezes, mediam um palmo.  Eram muitos, os armadores de rede em madeira de lei.  As janelas de duas bandas quase sempre se fechavam com traves no interior para maior segurança. (1)

            A Casa Grande da Fazenda Timbaúba é um desses belos monumentos do século passado, tão bem fixado por Juvenal Lamartine e que ainda resiste ao tempo e à civilização.  Uma construção de 1856, naquele estilo da época, a que se pode chamar de “Colonial rural do Seridó”.

A mim me parece que esses estilos, praticamente limitado às fronteiras do sertão potiguar, ainda não foi estudado. Já ouvi uma versão que admite a origem em Portugal , transplantado  para Macau (China), de onde sofreu  influências locais, vindo depois para o Seridó. É uma hipótese que  merece ser pesquisada. 
 Por enquanto, o que existe de  certo, são as raízes  desse estilo no barroco  português. O que eu ainda não consegui entender é que tendo sido a colonização do Seridó, feita por portugueses do Norte (Minho e Douro) e algumas das Ilhas, aquele estilo só tem  semelhança com as construções encontradas no Sul, na região do Algarve.  

            De construção muito sólida, paredes largas tem somente duas águas: a cumeeira muito alta, atravessada no meio, com o telhado descendo direto até as biqueiras na frente e atrás. É voltada para o nascente, um hábito seridoense.
  São sete quartos em baixo, dois no sótão, duas salas na frente, um salão, sala de oratório, copa, cozinha, dispensa, latrina, cinco quarto para depósito, alpendre na frente, área murada nos fundos e uma “Casa de Farinha”.

As duas salas da frente, interligadas entre si, têm saídas independentes para o alpendre; os aposentos, por questões de segurança, estão colocados no centro da casa, sem janelas para fora.  O salão, embora localizado bem no interior da casa, tem ligação direta, por um corredor lateral, com a sala da frente.

  A cozinha, comunica-se  com a sala de jantar, através da copa e a sala do oratório.  A área murada é ligada diretamente com a cozinha e com a saleta da escada por portas diferentes.  Dentro dessa área está localizado um quarto de depósito, onde é encontrado o pilão e um pouco mais adiante a latrina que se limita com a parede do muro, com um fosso ultrapassando para o lado de fora. 

Todo o muro que circunda esta área tem uma braça e meia de altura, com a parte cima abaulada, para dificultar qualquer tentativa de escalar. 
Na copa, há um acesso no lado do nascente, por onde entra o abastecimento de água e lenha.  Através dele chega-se ao forno de assar bolo que está do lado de fora, como também o chiqueiro das galinhas e dos porcos.

Os dois quartos do sótão eram pouco usados e de preferência pelas moças da casa.   As instalações sanitárias, que já foram modificadas, eram as mais rústicas que se podia imaginar.  Constava de um fosso coberto por um tablado de madeira de lei, com alguns buracos e tampa de madeira que funcionavam como vasos sanitários, deixando os dejetos cair diretamente no fundo do fosso. 
 O recinto da latrina, as mulheres utilizavam como banheiro, o famoso “banho de cuia”. 

A “Casa de Farinha”, um anexo lá nos fundos, ainda está em perfeito estado de conservação e pronta para uso.
 A velha Nanú a mantinha sempre fechada, só abrindo no período da “desmancha”; fora desse período era um lugar tranqüilo e silencioso, onde as galinhas e os guinés faziam seus ninhos para reprodução. 

            Funcionalmente falando, a “Casa Grande” separa muito bem os homens das mulheres e chega-se à conclusão de que foi planejada visando à segurança delas e das crianças.
  Aos homens, só o salão dois quartos internos ligados a ele, a sala da frente e o alpendre.  Os quartos externos, sendo depósito de selas e arreios, as vezes serviam de dormitório. O resto da casa era domínio das mulheres.
            O madeirame ainda está em perfeito estado de conservação, é todo em madeira de lei (miolo de aroeira). As portas de cedro, com grandes dobradiças e fechaduras de ferro batido, com chaves enorme  que ainda funcionam.
            Do mobiliário original, quase nada mais existe; foi levado pelos herdeiros, como lembrança da família.  Era uma mobília pobre e simples, como o povo que ali habitava.
Bancos coletivos de pau d`arco,  com quatro pés; tamboretes, armação de madeira de lei e o tampo de sola; a imensa mesa  de cumaru, onde eram servidas as refeições; vários baús, forrados de couro enfeitados com tachas de cabeças arredondadas, formando desenhos; alguns armários, para guardar louças, feitos em cumaru.
Não havia guarda roupas; usavam simplesmente em seu lugar os baús. A louça, utensílio, selas, nada mais existe.

  Porém a “Casa Grande” está lá, majestosa, acolhedora e solitária.  No frontispício está gravadas duas datas acompanhadas das iniciais do fundador da  fazenda: Gorgônio Paes de Bulhões.

- GPS 1856 (ano da construção – primeira fase)
- ANO 1862 (conclusão).
Foi para este tipo de casa que o poeta popular fez a seguinte sextilhas:

“Em cima d´uma lombada
Com a frente pro nascente
Alpendre, sótão, escada,
Cancela mão e batente
Eram as casas de fazendas
Com açude bem na frente. ”(2)

(1)  LAMARTINE/Juvenal – “(Velhos costumes do meu Sertão).
(2)  RIACHÃO/Vicente - “O sertão de antigamente” –
                                       Literatura de Cordel – Ed. Independente –
                                       Natal/RN




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